Dois meses depois de conseguir concluir a Maratona de Berlim, a dentista, blogueira e mãezona para os antenados no Instagram, teve a prova mais importante de sua vida para completar, desta vez contra o câncer de mama. E foi desta forma que ela encarou as intermináveis sessões de quimioterapia. Ela via cada sessão como um quilômetro de uma maratona, só focando no final do percurso. A seguir, confira a entrevista que ela concedeu para o Barra de Cereal. Já vou avisando: impossível concluir a entrevista sem se emocionar.

Quando e como você descobriu que estava com câncer?
Na verdade, foi um processo de quase oito meses. Senti um nodulo em abril, mas os exames acusaram benignidade. Eu tinha uma “voz” – intuição, anjo da guarda, sei la que nome posso dar – que me dizia que tinha alguma coisa errada. Em agosto procurei outro masto que me pediu uma ressonância. Ele me garantiu que os nódulos (eram oito em agosto, de quatro que haviam aparecido em abril) eram benignos. Em dezembro, quando fui fazer meu check up, me deu a louca e pedi para o meu clínico me fazer um pedido de rm das mamas. A médica laudou birads IV, foi feita a biopsia e confirmou o diagnostico de câncer.

Você fez cirurgia de retirada dos nódulos e retirou as mamas. Foi no mesmo período da descoberta?
Fiz uma adenomastectomia dos dois lados. A adeno é diferente da mastecto radical porque preserva o bico dos seios. Todo o tecido mamário e retirado e a prótese é colocada por trás do músculo peitoral. Retirei a direita preventivamente porque não queria passar por isso de novo.

Foram quantas sessões de quimioterapia? E quanto tempo de tratamento? O tratamento se encerrou?
Foram 16 sessões de quimio, ao longo de cinco meses e meio e 25 sessões de radioterapia todos os dias. O tratamento não encerra porque tenho que tomar o Tamoxifeno, que é um bloqueador de hormônios, que me coloca em menopausa precoce, por 10 anos. Daqui 10 anos, se você me entrevistar de novo, posso dizer que acabou. rs

Como foi se despedir dos cabelos?
Quando eu soube que ia fazer a quimio, queria raspar a cabeça. Mas, minha terapeuta me disse: “Corta mais curto antes porque senão o impacto vai ser grande”. Então, um dia antes de começar a quimio, cortei curto. Vou te confessar que chorei mais no dia de cortar curto do que de raspar. E no fim, o curto ficou mais bonito que o comprido. rs

Como foi a sua rotina durante o tratamento?
Eu sempre procurei não encarar o período da quimio como uma “desgraça”, que me impossibilitaria de fazer as coisas que gosto. Meu onco disse que eu poderia – e deveria – fazer atividades físicas durante a quimio. Eu corri ate o segundo mês de quimio. Depois não deu mais. A imunidade caiu, então fiquei na natação e na bike. Além disso, tirando os dias que ficava mal por conta da medicação, eu levava uma vida normal. Praticamente. A única coisa é que você tem que ter certos cuidados com a imunidade. Tenho certeza que a minha cabeça ajudou muito na redução dos sintomas da quimio. Mas eu respeitava meu corpo. Se ele dizia cama, era cama. Mas existe uma diferença enorme entre respeitar o corpo e acatar uma preguiça. Essa, eu nunca deixei me dominar no periodo do tratamento, porque sabia que ia ser ruim pra mim e pra quem convivia comigo.

Como a corrida ajudou você a superar o câncer?
Eu acho que a corrida te dá um foco muito grande e trabalha sua força de vontade. Pra correr, você tem que sair da cama, por uma roupa, calcar um tênis e sair, às vezes, no frio. Eu encarava da mesma forma: “Vamos lá, levanta dessa cama que você sabe que a recompensa depois (a sensação de bem-estar) vale muito a pena. Uma outra coisa: a corrida você encara quilômetro por quilômetro. Cada quilômetro é de um jeito, pode ser melhor ou pior. Não adianta querer fazer 10 sem passar pelo terceiro. Então, eu encarei cada sessão como um quilômetro de uma maratona. Só focando no fim.

Quando você retomou as corridas? Vi que você já foi até para o exterior correr, né?
Eu acabei as quimios dia 13 de junho. Dia 17 eu já estava no trota/caminha. Um mês depois, na viagem da Indonésia pela Nike, corri 23km. Importante dizer, Aline, que eu corro há 10 anos. Parei por três meses. Claro que tem toda a medicação, mas o corpo tem uma memória. E tudo que fiz, foi com aval dos meus médicos, que monitoram tudo.

Qual a importância do papel da família?
Essencial. Eu sempre digo que eles foram um dos pilares de tudo ter dado certo. Minha mãe e a família do meu marido se desdobraram em mil pra não deixar que ficasse tudo nas costas dele. Sempre revezando, vindo aqui ficar um semana, quando eu tinha quimio. Minha mãe ficou com a vida suspensa durante todo o período do meu tratamento. Minha sogra e meu sogro foram pais pra mim. Nós sempre tivemos uma ótima relação, mas depois do tratamento, eu os tenho como pais. O meu marido foi o melhor companheiro que a vida podia ter me dado. Acho que pelo fato dele ser muito racional, sempre encarou tudo de uma forma muito clara e confiante de que era só uma fase, que ia passar. E a minha filha foi e é meu motivo pra viver.

Claro que a gente também presenciou alguns “baixos” seus no Instagram, onde temos mais contato com a sua rotina, mas de onde vem o seu bom humor e sua garra?
Olha, não tem como não ter baixos durante esse processo. A quimio destrói todos os seus hormônios, até mesmo endorfina e serotonina. Você se olha e não se reconhece, você toma atitudes que em condições normais não tomaria, você explode com quem não deveria. A sua vida, seus planos ficam suspensos por um tempo. Acho que duas coisas que me ajudaram muito no quesito humor:  terapia ( porque descontava tudo na terapeuta kkkk) e o esporte. A garra vem do simples fato de que quero ver minha filha crescer, participar de tudo na vida dela. Então é a minha força motriz pra lutar contra qualquer coisa de ruim que apareça na minha vida.

Os problemas nos trazem muitas lições. O que você aprendeu com o câncer?
Poderia ficar horas fazendo uma lista kkkkkk. Mas acho que o principal de tudo é a frase que uso desde o dia que internalizei que estava com câncer: “Se você não parar, a vida para por você”. Então, hoje eu não me submeto mais a certas coisas que me submetia no passado. Não dá, não dá. Não deu tempo, deixa pra amanhã. Priorizo mais as coisas realmente importantes. Não me cobro mais tanto pra ser perfeita. Quero ser feliz.

Quando será o próximo desafio?
Se tudo der certo, a Maratona de Boston ano que vem, já que consegui o índice pra minha faixa etária em Berlim ano passado.

Qual será a sua próxima corrida?
A PX e meia de Miami em Outubro, mas vou “for fun”. O meu marido vai fazer o meio iron lá e arrumei essa provinha pra fazer.